Quando todo o mundo estava trancado em casa e torcendo pelo melhor para passarmos pela quarentena, eu me vi lidando com uma angústia extra: o famoso burnout.
Eu não soube prontamente o que estava acontecendo, eu só tinha uma certeza: eu sentia apatia em relação a tudo que antes me fazia bem.
Sexo, as comidas que mais gosto, os filmes que sempre amei, os hobbies que sempre me fizeram bem. De repente, nada disso me dava emoção alguma. Era como se eu me sentisse vazia mesmo fazendo
É importante dizer que, nesse momento, eu ainda não tinha noção do nível de estresse que acompanhava a minha rotina de trabalho.
Eu precisei sentir o impacto na minha vida pessoal primeiro para perceber o desequilíbrio na minha relação com a vida profissional.
Percebendo o burnout
Os primeiros sinais duraram muitos meses até que uma pessoa do trabalho me disse: “isso que você tem se chama Burnout. Você já ouviu falar?”
Era impossível não ter ouvido falar sobre isso no mercado em que eu trabalho, mas sabe quando a gente sempre tem a prepotência de achar que nada vai acontecer com a gente?
Foi justamente o que causou o meu choque. O fato de que não deveria ser nada surpreendente, considerando que eu já conhecia pessoas que passaram por essa síndrome e conhecia alguns sinais.
Para mim, o que mais imobilizava, era o profundo desespero que chegava todo domingo, sem atraso, logo após a hora do almoço.
Eu almoçava e logo vinha uma angústia de que me faltava tempo. Eu não havia descansado como deveria, eu não havia adiantado o trabalho como esperava… E isso abria um buraco no meu peito, uma vontade de chorar e logo vinha uma crise de ansiedade.
E isso ia muito além do tal Sunday blues que o pessoal fala. Não era uma depressão de domingo, era um desespero por já ser segunda novamente e eu não ter conseguido “dar conta”.
Relação não saudável com o trabalho
Sim, eu tenho total clareza atualmente que estava na minha cara que aquilo ali não era normal. Que eu já tinha excedido o limite em relação ao nível de cobrança e pressão que o trabalho estava causando na minha rotina, na minha vida pessoal e na minha saúde.
O estresse com o trabalho não era percebido na empresa, eu continuava a me esforçar de forma exagerada para corresponder às expectativas. Fazia horas extras não reconhecidas para entregar além do que deveria era o meu padrão.
Mas isso trouxe um alto custo.
Todo esse estresse explodia nos momentos que eram para ser pessoais. Compromissos comigo mesma, relações com amigas e namorado… Tudo sofria com o impacto disso, além da minha própria saúde física.
E vocês imaginam que eu tive algum suporte da empresa quando tudo isso aconteceu? Não. Claro que não.
Quando todo o meu esforço não foi reconhecido, eu entrei numa fossa. E foi que o burnout realmente virou um problema para o meu trabalho: essa tristeza me paralisava. Eu parei de performar.
Eu já não era útil e, como eu logo aprendi, sentir que não somos úteis é a pior coisa para quem tá sentindo a dor do burnout na pele.
A ingratidão
Uma das sensações mais curiosas de todo o período em que o burnout definia como seriam os meus dias, era uma constante e estranha culpa.
Eu me sentia ingrata por ter um trabalho “legal” e, ainda assim, ficar doente. Não dar conta.
Era como se eu fosse a única responsável pelo desequilíbio que claramente havia se instalado entre as minhas expectativas e as das pessoas com quem eu trabalhava.
Projetos, reuniões… De repente, tudo isso que antes me enchia de estusiasmo e ideias passou a fazer eu me sentir uma estranha no ninho. Como se eu não pertencesse, por mais que entregasse mais de mim do que eu tinha naquele momento.
A luz no fim do túnel
Depois de procurar uma médica e iniciar o acompanhamento com psicóloga duas vezes por semana nos primeiros cinco meses de tratamento, eu entendi que esse problema não era só meu.
Todo mundo no meu convívio conhecia pelo menos uma outra pessoa que estava passando pelo mesmo problema.
Saber que não era só comigo não resolvia o problema, mas mostrava que o problema não era eu. Eu era apenas mais uma vítima da tentativa de ser perfeita o tempo todo.
Não foi fácil. Não é fácil. Mas o burnout serviu para eu entender a minha carreira como uma parte da minha vida, e não a principal parte dela.
A minha carreira é importante, mas não é mais importante que a minha saúde. Não pode ser. E isso me ajudou a tomar decisões importantes.
Ainda faço tratamento, mas hoje sei que tipo de pessoa e, principalmente, que tipo de lugar eu quero estar, construir junto e dividir o meu conhecimento.
Se você também se sente completamente perdida e desesperada, sonhando que está resolvendo questões do trabalho ou com vontade de chorar porque precisa chorar tudo que precisa antes de entrar numa chamada, peça ajuda.
Procure ajuda médica, mas se eu puder deixar uma dica, não procure apoio da empresa que causou isso.
Chegar nesse estado de estresse e adoecimento sem que ninguém perceba ou se importe já mostra que não é ali que você vai conseguir o cuidado que precisa.
Boa sorte pra nós! E que a gente consiga encontrar um equilíbrio mais justo entre crescer e não crescer a qualquer custo.
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